sábado, 31 de dezembro de 2011

Veredas

"O senhor sabe o mais que é, de se navegar sertão num rumo sem termo, amanhecendo cada manhã num pouso diferente, sem juízo de raiz? Não se tem onde se acostumar os olhos, toda firmeza se dissolve. Isto é assim. Desde o raiar da aurora, o sertão tonteia. Os tamanhos."

(João Guimarães Rosa, Grande Sertão: Veredas)

Parque das Sete Cidades, Piauí
Abaixo: "macaco comendo banana"; Acima: "índio de perfil"

Parque das Sete Cidades, Piauí
"Casco de tartaruga" e pequena gruta á direita

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Parnaíba

Na beira do rio, coçando.
 Eu entendo que a vida no Nordeste não passa, ela acontece. Tem algo, como disse Antônio Cândido, de quase medieval. As casas simples do Piauí, com pessoas na rede do lado de fora, sorrindo e dizendo bom dia, lembram que existe outra proposta de vida. Simples, pobre, franciscana. Mas que acontece em vez de passar depressa.
Porto das Barcas, Parnaíba

A ruazinha que se perdeu há muito tempo no tempo

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

[pausa]

Praia da Atalaia, Luiz Corrêa, Piauí
Pausa para viagem.
Pausa no stress da viagem para dar uma aliviada.
Quem aí quer outro ritmo de vida?

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

comilanças: langós na Hungria

Almoço de primeira: lángos, sopa (que veio de brinde) e cerveja
Eu simplesmente amo pizza. Disparado, minha refeição preferida.
E quando chegamos na Hungria, descobri uma das maiores delícias do mundo: a pizza húngara - lángos.
Há muitos anos atrás o lángos era feito em um forno parecido com uns fornos de assar biscoito que também já foram comuns no Brasil.  Com o tempo, esse tipo de forno quase deixou de existit, pois é impossível ter um desses em um apartamento ou em uma casa pequena. Ao invés de abrir mão da delícia, os húngaros adaptaram a receita e começaram a fritar a massa ao invés de assar. E como, definitivamente, fritura é sinônimo de sabor, o resultado é maravilhoso!
Ao contrário da pizza tradicional, a versão moderna do lángos recebe o recheio depois da massa ser frita. A versão mais pedida entre os húngaros é a mais simples de todas: manteiga de alho, uma espécie de iogurte e queijo ralado. Mas como o recheio é colocado na hora, fica tudo à escolha do cliente!
Quando fomos em Szentendre, uma cidadezinha perto de Budapeste, achamos um lugar que produzia a versão tradicional da delícia. É claro que tivemos que provar também, né?
Essa é uma das comidas que já até pesquisei a receita na internet, pois vale a pena a empreitada!
Langós sendo preparado da forma tradicional,
em Szentendre
Hum, água na boca, hein?
Langós de 
Szentendre


No mercado de Budapeste: boca pouco cheia
durante a comilança - ao fundo, a placa do bar
especializado (e sempre cheio)



comilanças: pierogi na Polônia

O prato mais famoso da Polônia é o pierogi. É parecido com um ravióli, mas é só aparência... A massa é bem diferente, bem mais pesada - além de poder ser cozido ou frito. E, a diferença principal: não tem molho! Isso mesmo: para comer o pierogi você até pode pedir por um molho, mas ele vem em uma vasilha separada e você mergulha o pierogi lá. E os molhos são bem simples, um dia comemos apenas com manteiga derretida.
Os recheios são os mais variados possíveis. As opções mais comuns são bacon com batatas,  carne de porco, repolho ou cogumelos selvagens - delícia!
Como somos meio esfomeados, a primeira vez que fomos em um restaurante provar o tão famoso prato, pensamos que tínhamos sido enganados... cada porção vinha com nove ou doze unidades. Pedimos o com nove (um para cada um) só porque a garçonete falou que era mais do que suficiente. Quando chegou, falamos ao mesmo tempo: "ih, mais uma vez nossa fome foi subestimada, isso aqui tá muito pequeno..." Mas custamos a comer tudo, porque a massa é mesmo muito diferente de tudo que já provamos antes, e bem mais pesada.
Mas a delícia polonesa foi super aprovada e repetimos a dose várias dias para experimentar as diferentes versões. Por ser um prato muito tradicional, é muito fácil de achar - além de ser muito barato.
O restaurante mais famoso de Cracóvia e Varsóvia é o Zapiecek (fotos abaixo). As funcionárias trabalham com roupas típicas e a decoração é linda! Ah, o mais importante: tudo que comemos estava delicioso!
Hum, deu água na boca de lembrar!
Um prato super suculento de pierogis!
E as garçonetes do Zapiecek.


O cartaz do Zapiecek com outras comidas típicas polonesas que estão no cardápio:
pierogi, uma carne que não sei qual é (não é meu departamento),
uma espécie de panqueca, sopa, e um "cachorro quente aberto".
Para quem tiver disposição: se deu água na boca, no site do Zapiecek você pode aprender a receita tradicional do pierogi. Se o polonês não estiver afiado, a barra de tradução do google ajuda muito!
E também é possível ver o cardápio clicando aqui. A Polônia não faz parte da zona do Euro, então não se esqueça de converter os valores e dar um grande sorriso quando ver o preço em reais...

domingo, 27 de novembro de 2011

prato cheio

Há alguns anos atrás conhecemos um casal "internacional" que estava morando aqui em Belo Horizonte. Um  austríaco e uma alemã. Em certa ocasião, eles ganharam uma cesta de frutas e eu, que acompanhava curiosa a cena, fiquei impressionada: eles nunca tinham comprado nada que já não conhecessem antes. E - claro - foi ótimo ver a "boca boa" que eles faziam quando provavam cada uma das novidades.
"- Mas por que vocês nunca compraram nada de diferente antes?", perguntei.
"- Porque não sabíamos como se comia essas coisas..."
No início, fiquei encucada com a resposta. Como assim, "não sabia como se comia?" Depois, até entendi. Vai que eles resolviam comprar um pequi achando que era algum parente distante de um pêssego, por exemplo. Hospital, na certa.
Mas acho que nós acabamos nos arriscando mais do que eles, pois provamos tudo de diferente que nos aparecia.
Vou (tentar) nos próximos dias mostrar algumas das "experiências do paladar"!
Abraços de quem ainda está por aqui!

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

planos não planejados

Antes de voltarmos, falávamos sempre um para o outro que não pararíamos de escrever aqui. Agora, pensamos ainda no quanto queremos escrever, mas como, muitas vezes, os "deveres" do dia-a-dia nos impedem de levar esse plano a cabo.
E são mesmo os planos que passam pela minha cabeça nesse momento. Ele sabia que queria dar aulas de inglês quando voltássemos. Eu não sabia tanto assim. Das poucas coisas que eu achava que sabia, descobri que umas tantas estavam erradas. Por exemplo, que passaríamos as festas de final de ano com nossas famílias, que provavelmente ficaríamos algum tempo sem viajar.
E lá vamos nós, para o Piauí. Passagem (de ida) comprada, alguns hotéis reservados, e a sociologia e a filosofia - há algum tempo afastadas do nosso convívio - são o tema absoluto desses nossos dias. A ideia que me assustava no início, me aparece agora como uma feliz possibilidade. 
O que me impulsiona? A herança do sangue cigano, que tem dificuldades de se estabelecer em um só lugar, ou a herança do sangue nordestino, que me leva para climas sertanejos. Ou simplesmente a vontade de recomeçar não em algum lugar - como seria em Belo Horizonte -, mas com algum lugar.
Seja lá o que for... por um mês ou, quem sabe, mais do que isso... em breve, os dois "aqui" vão mandar notícias do Piauí.
Em Bruges, na Bélgica
Acreditem, ainda não vimos a maioria de
nossas fotos. Ontem, "descobri" esta.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Braganino

Ontem matando a saudade de assistir a um jogo de futebol com meu pai que, por sinal tem dito ter abandonado o futebol repetidamente a 12 anos, me lembrei de uma tarde muito engraçada em Atenas. Em todo lugar que estivemos a resposta a "você é brasileiro?" sempre vinha seguida de um desconfortante "yeah, I know Ronaldinho". Um saco. Mas no Monastikari, o bairro charmoso abaixo da Acrópole, o dono do restaurante respondeu: "yeah, I know Braganino". E olha que o time paulista do Bragantino nem sequer joga mais na primeira divisão!


quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Três semanas depois

Há exatas três semanas, ainda com um pouco de ressaca de cervejas belgas, pegávamos o vôo para São Paulo. Depois de horas em ônibus poloneses, perdemos a noção do que considerar uma viagem longa. Doze horas foram rápidas, mas o tempo de espera em São Paulo para vir até Belo Horizonte, essa cidade que comecei a odiar uns meses antes de me mudar para Dublin. Continua a mesma. Após um ano fora daqui, soa inevitavelmente arrogante dizer que as grandes cidades brasileiras se tornaram inabitáveis. Belo horizonte um exemplo mor. Inevitavelmente verdadeiro também.
Em Amsterdam, bicicletas a perder de vista...
Ao fundo, o Palácio Real
A novidade é pensar no Nordeste. Piauí talvez. Um pensamento ainda distante mas deixando de ser verde, amadurecendo após três semanas que já se parecem tão longas quanto o ano que se foi. Não conseguimos ficar parados.
Rever amigos e família nos foi uma experiência incrível (e continua sendo, já que ainda não revimos todos). Mas a saudade das poucas horas de tempo bom irlandesas vêm a vão. E muitas saudades das bicicletas de Amsterdã  também...

terça-feira, 13 de setembro de 2011

sobre alás e acás

Começamos uma viagem a um ano atrás e o principal objetivo era aprender uma nova língua. Aprendemos muito mais do que isso. Aprendemos - na prática - que, muitas vezes, sutis diferenças no significado de uma mesma palavra podem causar situações um tanto quanto embaraçosas.
O mineirês, que tenho sempre afiado, foi causa de algumas dessas situações. Em Istambul, onde grande parte da população é muçulmana, tive que reeducar meu português para não arrumar um problema. Depois de dois ou três dias com a sensação de que, às vezes, todos os desconhecidos olhares se voltavam para mim, matei a charada: isso sempre acontecia quando eu via alguma coisa que me chamava a atenção e compartilhava usando o termo "alá". "Alá, aquele doce que eu quero comer...", "Alá, que ponte bonita..."
"alá a gatinha que mora com os filhotes na vitrine!"
Todo bom mineiro sabe que "alá" é o mesmo que "olha lá", mas para um muçulmano Alá é o nome de Deus - que, por isso, não deve ser usado em vão. Para quem não fala português, a única parte "entendível" na frase "alá aquele doce..." é o tal do alá. E é óbvio que, por exemplo, apontar para uma comida e dizer uma palavra sagrada pode não soar tão bem.
E no meu primeiro dia em Itabira me lembrei dessa estória ao recordar um termo que, talvez, tenha surgido entre as montanhas e o ferro da cidade onde vivi por tantos anos: acá. Sem o valor sagrado de Alá (com letra maiúscula), mas com o mesmo valor simbólico do meu alá (em minúsculas mesmo), o acá é, para mim, um dos mais importantes marcadores da cultura itabirana.
Nesse um ano, acho que quase me esqueci dessa palavra que, confesso, ainda não me sinto desenvolta o suficiente para incorporar no meu mineirês. Pois é, quase. Cinco minutos de caminhada pela cidade foram suficientes para fazer com que, não só o acá, mas também sobre o jeito de ser dos mineiros. Inigualável a tudo que vimos por todos os lugares que passamos. Inigualável e imperdível!

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Último Dia

Hoje é o aniversário do Dindi - que aliás, começou ontem. E começou com as despedidas oficiais... não com as despedidas de cada cidade ou país que nos acostumamos nos últimos tempos, mas com a despedida do continente que nos acolheu no último ano.
Não foi fácil sair do Brasil há um ano, mas não é tão fácil sair daqui agora. Estamos morrendo de saudades da nossa família, amigos, de tantos lugares, músicas (ah, o Terça Nobre que nos aguarde), sabores... mas despedidas são sempre difíceis. E, apesar da experiência que venho acumulando, fazer as malas é sempre árdua tarefa.
Em dois dias estaremos em Belo Horizonte. Ele estará um ano mais velho, mas parece que tanto se passou desde que nos despedimos de todos em Boa Esperança em agosto do ano passado que eu acreditaria se me dissessem que ao invés de 27 ele vai completar um pouco mais.


ele envelhecendo...
...e ela, criança

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

preparação para a comilança

Um ano fora do Brasil e eu juro que não sofri com coisas que todo brasileir@ sofre quando está longe de casa. Vivi bem sem comer arroz com feijão todo dia, (aliás, aqui só comemos feijão enlatado que ficava gostoso e tudo, mas estava longe de ser a mesma coisa), couve, palmito, açaí, pastel, farofa, caldo de cana... É claro que às vezes dava vontade, mas passava rápido.
Hum... delícia!
Agora, com as malas prontas (e isso não é uma metáfora, já estão 99% prontas mesmo) estou morrendo de vontade de comer tudo! Ontem lembrei de como, por exemplo, palmito é uma delícia e quase tivemos um ataque! Aí, já viu... só comendo alguma outra coisa muito gostosa para esquecer. Ele atacou uma caixa de chocolates e eu...

sábado, 27 de agosto de 2011

...quando voltarmos...

Há muito pouco tempo da nossa volta - aliás, pouquíssimo - a todo momento algum de nós começa uma diferente frase que sempre começa da mesma forma:  "quando voltarmos para o Brasil..."
E as mais diversas ideias e planos passam pela nossa cabeça, a todo momento. Começar a valorizar mais as pequenas coisas, comer mais em casa, mudar de cerveja, ter vasinhos de flores para colocar na sala da casa que ainda não temos. Planos com relação a pessoas, a coisas, a atitudes.
"...quando voltarmos vamos comprar duas bicicletas..."
Sem dúvidas, mudamos muito com todo o processo dessa viagem. Acho, mudamos para melhor. Hoje consigo olhar para as coisas ao meu redor e pensá-las em suas devidas proporções. Sem sofrer por aquilo que não merece. Sem dar um valor indevido a uma coisa em si. Aliás, que triste são as coisas quando consideradas em si mesmas.
Comecei um texto sobre os inúmeros planos e expectativas que andam por nossas cabeças nos últimos dias e terminei dando uma grande volta. Em Amsterdam, sem a menor dúvida a cidade mais vibrante e bonita que já conhecemos, difícil não imaginar como tudo vai estar / ser quando voltarmos.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Dublagem

De volta a Berlim depois de 11 horas num ônibus polonês. Quatro filmes dublados. Sabem como é ouvir a mesma voz 11 horas seguidas? Pois é, não é só em Portugal que existem "coisas de Português". Aliás, o tipo de dublagem que é feito na Polônia supera todas as brilhantes ideias que Manuel e Joaquim já devem ter tido na vida!

Entenderam? Só existe uma voz para todos os personagens! Detalhes importantes: o tom da voz é sempre o mesmo (não importa se a frase no filme é dita de forma sensual, histérica ou se é só um sussurro). A voz utilizada nas dublagens também é sempre a mesma. Ou seja: esse moço aí é conhecido de longa data por qualquer ouvido polonês.
Dá para entender? Apesar do desconforto da longa viagem, chegamos sãos e salvos em Berlim. Mas tive pesadelos com essa voz.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

O trompetista de Cracóvia

O Hejnal é uma melodia simples, de somente 5 notas, que data do século XIII, tocada do alto da basílica de Santa Maria (a Mariacka). Nos tempos medievais, o tocador avisava sobre a abertura e fechamento dos portões da citadela. Hoje, 24 vezes ao dia ele a toca para avisar da passagem do tempo. Uma melodia dramática com uma inconclusão abrupta. Causa arrepios no centro da cidade velha, na praça do mercado. Dá pra sentir o drama histórico dessa cidade maravilhosa que é Cracóvia. Um dos trompetistas disse uma vez que nunca conseguiria tocar nenhuma outra melodia senão a Hejnal.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

um lar na Polônia

Depois de tanto tempo "morando" em hotéis e, mais ainda, depois de tanto tempo sem ter um lar só para nós dois - já faz mais de um ano desde que devolvemos a chave do apartamento que durante três anos chamamos de nosso - lembramos como é ter um lar.
Graças aos baixíssimos preços da Polônia, reservamos um hotel de luxo sem saber que o fazíamos. Detalhe importante: pagando a mesma quantia que pagamos durante toda a viagem para ficar em hotéis/albergues bem maomenos. Ah, e também não nos demos conta quando fizemos a reserva que, ao invés de "hotel" estava escrito "apart-hotel".
Por sorte (ou destino?) tudo isso aconteceu nas últimas semanas de nossa viagem. Escrevo do que, conclui, ser o apartamento dos meus sonhos. Pequeno, moderno, mas simples e com tudo que precisamos dentro.
Cheguei a concordar com ele de que morar em um hotel deveria ser ótimo. Mas, desde que entramos no apart-hotel voltei atrás com tudo. Não me lembrava como era ter uma sala, uma cozinha. Ou melhor, nada como ter um lugar para chamar de lar. Só temos mais três semanas. Estou triste porque nossa viagem vai acabar, pois tudo tem sido maravilhoso, mas estou com saudades das pessoas que amo.
Agora, também estou com saudades de um lar que vamos voltar a ter.
Café da manhã

No sofá da sala - se a gente pedir muito, será
que alguém deixa a gente ficar?

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

No leste europeu

Muitas têm sido nossas aventuras desde que saímos de Dublin. Cruzamos o continente velho, de Lisboa até Cracóvia na Polônia. Passamos por Frankfurt e Dresden, a cidade que foi totalmente reconstruída após a segunda guerra. Estamos em Cracóvia desde domingo à noite, depois de cruzar a Alemanha de trem. Mas de todas as as experiências por que temos passado nesses quase quatro meses na estrada, a de ontem foi a de mais impacto, a mais chocante e inesperada. Quase duas horas de trem de Cracóvia, a cidade de Oswiecim passa despercebida se não fosse seu nome alemão, Auschwitz. Antes da invasão germânica na Polônia, a pequena vila de Oswiecim  ainda não conhecia os limites da crueldade. O antigo campo hoje abriga um museu que serve de alerta aos terrores da guerra. O mais chocante é caminhar pelo segundo complexo, conhecido como Birkenau (Auschwitz II). Lá a estrutura do antigo campo de concentração ainda se mantém, como os trilhos do trem que trazia os judeus de vários lugares da Europa, as ruínas das câmeras de gás e do crematório, e cinzas humanas. Foram horas de caminhada pelo campo. As toneladas de cabelos e os objetos pessoais encontrados durante a liberação do campo pelos soviéticos, expostas em Auschwitz I, são tão chocantes quanto o paredão onde poloneses, judeus, prisioneiros de guerra e homossexuais eram fuzilados. 
Os trilhos que levavam os judeus deportados direto para a câmera de gás em Auschwitz II.

A entrada de Auschwitz I, com a frase cínica "Só o trabalho liberta".
O caminho de volta a Cracóvia foi tomado pelo silêncio dos dois. O silêncio que até agora me causa medo. Visitar Auschwitz foi uma experiência inesperada e aterrorizante.  

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Pra não se esquecer nunca

Em meu volino que desentoa
te declara meu violino
que te amo,te amo minha violoncela,
minha mulherzinha escura e clara,
meu coração,minha dentadura,
minha claridade e colher,
meu sal da semana escura,
minha lua de janela clara.


terça-feira, 19 de julho de 2011

O rio além da minha aldeia

Há mais de dois meses eu não penso em nada. E não é porque me curei da doença dos olhos. Não, embora Caeiro seja meu preferido, eu não consigo parar de pensar muito. Mas escrevo pouco. E ela tem a razão de achar que nossas experiências aqui estão se acumulando demais. Estão mesmo. Mas minhas lembranças vão e voltam desde o velhinho que me pediu o cigarro em Burano, o comunista que nos abordou no bonde em Budapeste, até o mercado hippie onde estouramos bolinhas de sabão em Kreuzberg, uns dos bairros mais legais que visitamos em Berlim. Dessa cidade que é ao mesmo tempo glamourosa e punk, fomos para a velha e conhecida (embora pisasse lá pela primeira vez) Lisboa. Lá o Tejo nos encantou tanto como as montanhas de Sintra. Sim, "O rio da minha aldeia não faz pensar em nada. Quem está ao pé dele está só ao pé dele". Mas fez pensar em muita coisa sim. Nas viagens pelo mar que levaram pro Brasil os quitutes e os deputados. As placas têm o mesmo português, prolixo e  preocupado com as qualidades que nem sempre existem. O jeito brasileiro, não só o da cordialidade, veio mesmo do Tejo. E de lá vieram muitas outras coisas como o Barroco de Aleijadinho e as ruazinhas de Ouro Preto, o choro canção que tirou seu lamento do belo Fado. Ah Lisboa, quatro dias foram poucos demais.
Terreiro do Paço, Lisboa

Agora em Barcelona passeamos pela cidade gótica, e comemos tapas com Estrela. Espero retomar o blog com o mesmo fôlego que ainda nos resta. São já 78 dias.

sábado, 9 de julho de 2011

em Berlim

Berliner Dom, a linda catedral protestante da cidade,
em uma bela tarde de sol.
Em Berlim, sem internet no quarto... agora, estou no saguão do hotel. O texto é curto, pois tem que acabar antes do banho do um que quase já se esqueceu como escrever.
Ontem fomos no pedaço do muro que sobrou e no Memorial do Holocausto. O que esperar de uma cidade com uma história tão conturbada? A diferença entre ler um livro de história e aprender sobre a perseguição nazista aos judeus e estar aqui e ver de perto, conhecer a vida de famílias inteiras que desapareceram... é como se somente agora eu tomasse conhecimento de tudo isso. Acho que antes eu só pensava que sabia alguma coisa. E depois de tudo isso... um muro. Um muro que existiu até pouco tempo atrás.
Talvez por isso Berlim seja uma cidade tão "insana". A quantidade de pessoas bizarras daqui eleva a média de qualquer estatística.
Meu tempo - e a bateria do computador - só me permitem essa notinha. Espero conseguir não ficar tanto tempo sem escrever, pois as estórias daqui estão se acumulando cada vez mais.
Que tal deitar de biquíni em uma grama alta como essa para aproveitar o sol?
No Mauer Park, você pode tudo!

sábado, 2 de julho de 2011

cuco!

Desde o século XV, o Relógio Astronômico do prédio da antiga prefeitura de Praga avisa que uma nova hora chega. Nos juntamos, por duas vezes, a uma multidão de turistas que também esperavam para ver. Pensei que era só um cuco, mas é muito mais elaborado. O vídeo não mostra os detalhes: o esqueleto que puxa a corda para bater o sino, os apóstolos que passam pelas janelinhas e o galo que bate as assas quando as tais janelinhas se fecham. O esqueleto representa a morte, comandando a passagem do tempo. Até seria algo profundo, se não fosse tão bonito! Nesses momentos, essas representações passam despercebidas...
Como se não bastasse a beleza de uma invenção tão antiga e que continua funcionando tão bem... os corneteiros da torre completam o espetáculo.


Prédio da Antiga Prefeitura de Praga e a torre do relógio

O relógio mostra a posição da lua, do sol, dos signos,
além da hora em três diferentes sistemas
(da antiga Bohemia, o babilônico e o romano)

quinta-feira, 30 de junho de 2011

comer, comer (parte I)

O fato de termos alguns amigos húngaros nos ajudou a aproveitar melhor as delícias culinárias de Budapeste, mais do que de qualquer outro lugar. Os pratos mais famosos sempre são destacados em qualquer guia de viagem, mas tenho a impressão que os mais gostosos mesmo sempre passam batido. O mesmo deve acontecer, por exemplo, com um guia do Brasil escrito para gringos. Com certeza, o guia deve dizer que feijoada é um prato muito tradicional, mas será que algum mencionaria outras delícias como pão de queijo, pastel, coxinha (sou vegetariana, mas sei que é gostoso), tutu, caldo de cana? Duvido! E esses húngaros não brincam quando o assunto é comer ou beber! E foi nessas gostosuras que passam batidas pela maioria dos turistas que nós nos perdemos. Só para dar uma água na boca, vou contar sobre algumas delas.

A doçura do comunismo
O comunismo não poderia ter deixado um presente mais gostoso do que esse chocolate. Pois é, o comunismo. Durante o regime comunista, as comidas eram, digamos, "padronizadas" e essa foi uma sobremesa importada da antiga União Soviética, mas que, felizmente, não caiu com a mudança do regime. E a delícia não poderia ser mais simples: queijo cotage com essência de baunilha, coberto com chocolate. Dá até briga! A primeira coisa que fizemos quando chegamos em Budapeste foi ir no supermercado. A foto mostra nossa comprinha!

Amanhã continuo a lista mais suculenta do mundo!


quarta-feira, 29 de junho de 2011

o último egészségedre

Vista do Castelo de Buda:
Rio Danúbio, Parlamento, Ilha de Margarete
Uma semana em Budapeste. Terminamos nosso último dia aqui relendo os guias que ganhamos de nossos amigos húngaros, Linda e Lajos, e chateados por não termos conseguido ir nem em metade de tudo que a cidade tem para oferecer.
Pelo menos, tivemos tempo suficiente para ter mais do que certeza que Budapeste está no topo de qualquer lista.
Estamos terminando de arrumar as malas. Nosso ônibus para Praga sai amanhã de manhã. Nas malas, os deliciosos bolinhos que lembram rocambole, mas que são completamente diferentes (mákos béigle), o chocolate recheado com queijo cotage e baunilha (quem pôde inventar um doce assim tão gostoso?), páprica e... vontade de ficar mais um mês.
Bebendo a última cerveja húngara, me despeço com a primeira palavra (das poucas) que aprendi desse idioma tão bonito e tão impossível de entender: egészségedre
Ponte Széchenyi, a primeira ligação entre Buda e Peste



domingo, 26 de junho de 2011

ranking de mercados

Sempre fomos fãs do Mercado Central de Belo Horizonte, apesar de nem irmos lá com a frequência que gostaríamos. Para mim, um mercado pode facilmente ser o lugar mais divertido de uma cidade. O ambiente descontraído, os bons preços, a comida com gostinho de caseira. Por isso, onde quer que estejamos, se tem um mercado, com certeza não vamos deixar de conhecê-lo.
Meu ranking, por ora, é o seguinte:

BRONZE
Spice Bazaar, em Istambul
Uma das bancas de doces e temperos, no Spice Bazaar
Originalmente, só vendia pimentas e especiarias. Hoje, vende comidas em geral - sobretudo doces. Tem também lojas de presentes, roupas, artigos típicos, joalherias, algumas lanchonetes, mas falta um espaço para cervejas e tira-gostos.

PRATA
Naschmarkt, em Viena
Azeitonas de cair o queixo
Quase dois quilômetros de mercado, com três corredores paralelos. Esse mercado não é coberto, todas as "lojas" são barraquinhas - algumas com mais estrutura, outras bem simples. Vende temperos, comidas típicas, azeitonas, lanches, pães, bebidas, frutas, vegetais... e ainda roupas, acessórios, souvenirs. Além de ter bares e restaurantes que funcionam noite a dentro. Aos sábados, o mercado quase dobra de tamanho com uma feirinha de coisas usadas em geral.
Vista do mercado


OURO
Great Market Hall, Budapeste
O campeão, em Budapeste
Para começo de conversa, nunca vi um mercado em um prédio tão bonito. Três andares para alegrar todo tipo de gosto. O andar principal vende frutas, verduras, comidas e bebidas típicas, presentes, doces. O andar de baixo tem algumas lanchonetes, açougues, peixarias e mais verduras. O andar de cima é o mais divertido: ao lado das lojas de presentes típicos, roupas, artigos em couro e forros de mesa bordados em linho, estão os bares! Com bebidas e comidas para os mais diversos paladares e, o principal: tudo muito barato e delicioso!
Nem é preciso explicar mais porque esse mercado ganhou posição tão privilegiada na minha lista.
Ah, é claro que almoçamos lá todo santo dia desde que chegamos em Budapeste. Mas isso já merece outro texto...


sábado, 25 de junho de 2011

com uns "mils" no bolso

Quem aí se lembra da época da alta inflação no Brasil, quando de manhã um cafezinho no bar da esquina custava mil e no final da tarde custava mil e trezentos? Pois é, eu ainda era criança e isso, é claro, não era um problema para mim. Mas desde quando chegamos em Budapeste, tem sido difícil fazer tantas contas. Na Hungria, a inflação não é o "monstro" que era no Brasil. Na verdade, nem sei se chega a ser um problema. O problema é que o Florim Húngaro não tem muita força: um real equivale a 118 florins! E como nosso dinheiro está todo em euros, a conversão fica ainda mais injusta: um eurinho vira mais de 260 florins!
Assim que descemos do ônibus vindo de Viena para cá, fomos em um caixa eletrônico. Opções de saque: 5.000, 10.000, 20.000, 50.000 ou 100.000. Óh céus, quanto zero! Sacamos 20 mil: uma nota de 10 (mil) e duas de 5 (mil). Confesso que na hora me deu um certo medo - "nossa, a gente com esse dinheirão todo, carregando essas malas tão pesadas... devíamos pegar um táxi ao invés de um metrô". Mas nem era tanto dinheiro assim.
Mais difícil do que ficar fazendo a conversão o tempo todo, é "reacostumar o cérebro" para conseguir ver que, por exemplo, uma cerveja a 300 florins é uma pechincha! Um quilo de cerejas por 350 florins, nem se fala! Principalmente depois de ter morado um tempo em Dublin, onde tudo é tão caro, estar em um lugar com preços tão "honestos" é estar no paraíso. Um dos motivos que fez com que mudássemos a rota da nossa viagem: os cinco dias que planejávamos ficar vão ser quase multiplicados por dois. Tiramos Munique dos planos para ter mais tempo em Budapeste. Outra conversão na qual saímos ganhando.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

a valsa vienense*

Viena foi uma feliz surpresa no nosso percurso. Se antes de começar a ler sobre os países da Europa eu tivesse que já escolher onde queria ir, com certeza a Áustria ficaria de fora. Felizmente, uma viagem não se faz sem planejamento, e seria um grande erro se não tivéssemos passado por esse destino.
Foi em Viena que entendi o que é o tal do "primeiro mundo". Ontem, vimos dois amigos discutindo porque um deles atravessou a rua sem que o sinal de pedestres estivesse aberto. Detalhe: a rua estava completamente deserta, nenhum carro à vista. Então, por que esperar pelo sinal? Talvez pelo simples fato de se existe uma lei, ela tem que ser seguida para que tudo funcione bem.
Uma parte da fachada do Teatro da Ópera

Além da ordem, limpeza, organização, educação e etcs, a cidade tem milhões de pontos turísticos e coisas para se fazer. Fomos comemorar nosso aniversário de namoro (pois é, todo mês comemoramos, até hoje) em um dos mais tradicionais eventos da cidade: a ópera! O enorme - e lindo - prédio da Ópera de Viena, sedia espetáculos musicais (concertos, balés e, claro, óperas) todos os dias. O ingresso mais caro custa, mais ou menos, 200 euros. Mas quem, como nós, ainda conta as moedinhas não precisa ficar de fora, porque o ingresso mais barato custa só 3 eurinhos! Quem não quer gastar absolutamente nada também tem vez: durante o verão todas as apresentações são transmitidas ao vivo em um enorme telão colocado na lateral do prédio, juntamente com várias cadeiras. Impossível reclamar!
No Teatro da Ópera - finalmente pudemos usar nossas
roupas "chiques" que estavam mofando na mala
desde que viemos do Brasil.
Os dias de Viena se foram tão rápido que nem tivemos tempo de escrever. Hoje chegamos na Hungria, em Budapeste - um dos lugares que sempre estiveram na "minha lista". Várias estórias ficaram para trás e vamos contá-las qualquer dia.

*a valsa vienense: o título não se encaixa muito com o texto, eu sei. Mas há muito tempo descobri que Viena deveria ter alguma relação com música por causa de um verso do poema José, do Drummond. Eu só não imaginava que a atmosfera musical da cidade fosse tão forte, tão viva. Depois de conhecer Viena, fiquei com a sensação de ter conseguido entender um pouco mais o poema.

[...] Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você cansasse,
se você morresse
Mas você não morre,
você é duro, José! [...]
Memorial Mozart, no Buggarten - um dos jardins
do antigo palácio dos Habsburgos.


sexta-feira, 17 de junho de 2011

a casa da semana

Sem casa, sem endereço. Cada vez que vamos de um país para outro, é como se mudássemos de casa. E hoje, nos mudamos outra vez. De Istambul, para Viena.
A impressão que tenho é que o avião que nos trouxe de lá para cá atravessou um universo paralelo e agora estamos, por assim dizer, em outro mundo. Da confusão de Istambul, para a beleza tão pacífica e amigável da Áustria.
Chegamos, depois de uma longa e desconfortável viagem. Mas como valeu a pena!
Viena, nosso lar por alguns dias. Depois de apenas umas poucas horas aqui, já me pergunto porque temos tão pouco tempo, porque não meses ao invés de dias.

o canto da mesquita

Ao fundo, a Mesquita Azul que tem esse
por causa dos detalhes em azul na parte
interna da cúpula.
Na Itália devemos ter entrado em, mais ou menos, uma 120 igrejas. E algumas eram tão grandes e bonitas que mais pareciam ser museus do que igrejas, chegamos a ficar horas dentro de algumas.
E o que a Itália tem de igrejas, Istambul tem de mesquitas. Nunca tinha sequer visto uma mesquita de perto e todas, mesmo as muito pequenininhas, são lindas.
A mais famosa é a Sultan Ahmed Mosque, mais conhecida como Mesquita Azul. Durante muitos anos, essa mesquita era o ponto de partida dos muçulmanos que começavam a peregrinação rumo à Meca. Muito diferente das super ornamentadas igrejas, as mesquitas são grandiosas por fora, mas bem mais "simples" por dentro. Em geral, existem várias pinturas de flores e formas geométricas - no carpete, na cúpula, nas paredes, nos vitrais. Os enormes lustres são muito baixos e quase se consegue tocar alguns deles.
Para entrar, todos têm que, antes de tudo, tirar os sapatos. O carpete é sempre muito macio e a maioria dos fiéis se senta ou ajoelha no chão. Todos devem estar com joelhos e ombros cobertos e as mulheres devem cobrir os cabelos.
Várias vezes por dia, um canto sagrado é entoado pelos alto-falantes das mesquitas cidade afora e ouve-se de longe a forte voz do cantor. Na praça da Mesquita Azul, os cantores das várias mesquitas do entorno parecem formar um coral, com um canto muito sincronizado. Em uma das mesquitas que conhecemos, entramos bem na hora que o canto começou.




Apesar de termos tentado filmar e fotografar algumas coisas meio "escondido" para não parecer falta de respeito, quando a cerimônia pareceu ter acabado uma mulher que estava ao nosso lado - mas na parte dos fiéis e não dos turistas - perguntou se nós não queríamos que ela tirasse fotos nossa dentro da mesquita. Ela acabou tirando mais de uma, dando sempre as coordenadas de como e onde devíamos ficar. Depois da sessão fotográfica, nos despedimos e ela se foi. Mas voltou um minuto depois, com sua câmera na mão para nos mostrar que, durante a cerimônia, ela tirou várias fotos dos dois aqui. Eu bem queria entender o porquê. Nossa única comunicação que não foi através de gestos, foi justamente nessa hora quando ela perguntou: "América?" E respondemos: "Brasil!" Ela pareceu feliz com a resposta, se despediu com um sorriso e foi-se embora com sei lá quantas fotos nossas.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

com o pé do outro lado

Istambul é conhecida como a porta do Oriente: a cidade é dividida pelo Estreito de Bósforo que separa a parte européia da parte asiática. Ontem fomos pela primeira vez do outro lado. Existem três formas de se chegar a alguma das diversas partes asiáticas de Istambul: atravessando a ponte que liga os dois lados - o percurso pode ser feito de carro, ônibus ou a pé - ou pegar um barco. A última opção venceu com a unanimidade de dois votos!
Tinha lido sobre um passeio turístico de seis horas e que custa 25TL*, mas que apenas pára em uma pequena comunidade de pescadores, onde só existe um castelo (fechado para o público) e alguns restaurantes bem caros. Quase desembolsamos, mas acho que o ar da Turquia fez com que o espírito  negociador se manifestasse em nós! Ao que parece, esse passeio turístico não é lá grandes coisas e, como pessoas com horror a excursões que somos, estávamos com medo de, de repente, nos sentirmos parte de uma.
No barco, com locais ao invés de turistas,
de frente para uma das estações de Kadikoy
É claro que tinha que existir outra opção, pois quem mora aqui também pode ir de um lado para outro pela via marítima sem pagar tanto. A tempo, descobrimos um barco, que faz parte do transporte público de Istambul, que faz o mesmo trajeto do barco de turistas, mas cobra só 1,75TL por trajeto. Nada mal. E quando vimos algumas diferenças básicas entre os dois barcos, me senti mais no lucro ainda: o turístico é lotado e parece ser impossível conseguir um espaço para uma boa foto, enquanto o barco público é bem vazio - além de podermos ir e voltar quando quisermos.
Assim, pisamos, digamos assim, na pontinha da Ásia. Fomos para os bairros de Uskudar e Kadikoy - ambos bem diferentes da loucura turística do antigo centro histórico da parte europeia.
Em uma típica "casa de chá", em Uskudar.
Almoçamos em restaurantes bem locais e nos comunicamos com os garçons praticamente só com gestos. A minha sorte é que a palavra vegetariana é mais ou menos parecida em turco. Depois do almoço, tomamos uns oito chás em uma casa de chás. Geralmente, eles nem têm cardápios, pois o único produto à venda é chá de maçã - o cafezinho dos turcos.
Mais do que estar na Ásia, foi também ótimo ter visto um pouco do dia-a-dia das pessoas, fora do tumultuado centro turístico onde todos são vendedores e - sobretudo - negociantes.


*TL: lira turca, a moeda do país. Atualmente, uma lira turca vale pouco mais do que um real (uns três centavos).

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Dois aqui

no caminho para Aegina, na Grécia.
Uma das poucas fotos que temos juntos
porque tenho vergonha de pedir para
os outros. E ela me aguenta.
Eu tenho mania de sempre limpar a tela do computador e conferir meu extrato bancário. Ela fica nervosa quando está com fome. São pouco mais de nove meses desde que deixamos o terceiro andar da Belmiro Braga. Lá, éramos três e por três anos cozinhamos, limpamos a casa e ouvíamos música até tarde comendo petisco e tomando cerveja. Desde que deixamos Dublin, passamos as vinte e quatro horas do dia juntos. Quando começamos nossa viagem de 120 dias pensei que seria para mim uma experiência existencial. Aprender a se encontrar e descobrir o que vale o lugar onde está não é um clichê de livros de auto ajuda. É na verdade uma coisa séria e difícil. Tenho descoberto que sou mais complicado do que imaginava, e ela me salva de um completo desastre. Depois desses 120 dias só espero ter aprendido a pelo menos dizer obrigado. Obrigado por  estarmos a mais de seis anos juntos. No caminho de Tessalônica para Istambul conhecemos um casal de mais ou menos sessenta anos. Perguntei se estavam viajando fazia muito tempo. "Há 36 anos, quando nos conhecemos e nos casamos na Bolívia". Olhei pra ela e disse que era exatamente o que eu sonhava para os dois... 

sábado, 11 de junho de 2011

Exato um mês na estrada

Desde que deixamos Bolonha começamos um trajeto bastante diferente para nossos olhos. De Atenas para Tessalônica, passando pelo Monte Olimpo. Da Tessalônica para Istambul, passando por Kavala e Tekirdag. As 48 horas mais lindas da minha vida. São exatos 31 dias na estrada, não sei sequer que dia é hoje. Da mesquita ouço o canto que me impressiona muito. A viagem da Tessalônica para Istambul durou quase 11 horas, com quase duas horas paradas na fronteira. Ao chegarmos no terminal rodoviário de Otogar, que fica um pouco fora da cidade, pegamos outro ônibus que teoricamente deveria nos deixar na estação Askaray, onde pegaríamos um metrô de superfície para Sultanahmet, o bairro histórico de Istambul onde estamos agora. O motorista nos deixou no meio de um viaduto, em Askaray, sem referências e passeios. Os dois aqui e um casal de 70 anos (ele americano e ela da Nova Zelândia). Não sei o que aconteceu com eles, pois pegamos um táxi negociado a 10 Liras Turcas, que foram pagas com 10 Euros, mais que o dobro. Mas chegamos bem. Segundo o motorista gastaríamos on dakika (10 minutos) a pé do viaduto ao Sultanahmet. Gastamos 25 de táxi.    
O hostel é muito simpático e tem um terraço virado pro mar. Tivemos um café da manhã turco e depois comemos Kebab e visitamos uma mesquita. 
despedida em Thessaloniki com o tradicional Meze de azeitonas.
O
Meze nada mais é que a versão grega do tira-gosto.
Na foto, quatro tipos de azeitonas, nenhuma parecida com nada no Brasil
Na Blue Mosque, em Istambul

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Experiências Atenienses: cervejas mitológicas e desbravando a cozinha grega

Depois de um dia de muito sol, fomos tomar uma Mythus, a melhor cerveja grega (quiçá a melhor melhor cerveja depois da Guinness), no bar do Costas. Bem, o dinheiro curto, claro, porque o filósofo não ganhou nada na Acrópole. Bem, isso em Atenas não nos foi um problema, já que um senhor muito simpático que não conhecemos nos pagou duas cervejas. Como estávamos virando fregueses assíduos, comentei com Kaka que "se bobear o Costas nos paga uma gelada eim?". Não é que ele chegou com duas mitológicas e disse: "essas são de graça, daquele senhor, não sei porque, mas disse ele que vai pagar bebida pra vocês". A melhor explicação é que os gregos são extremamente legais. Uma pena a língua ser tão distante e dificultar um bom e velho papo no buteco com o cara que sem mais nem menos pagou duas pros dois aqui.
Já no dia seguinte, no Monastikari, um bairro histórico e bastante interessante de Atenas, conhecemos a cozinha de um restaurante cujo chefe conhecia o Braganino (entenda-se o Bragantino, time de SP). Estávamos passando na rua e ele perguntou se queríamos comer. Disse que já tínhamos almoçado e ele insistiu que conhecêssemos a cozinha, só pra ver como se faz a tradicional comida grega. Inhamiiii Inhammmi, quase comemos de novo.  
as mitológicas
No mercado de pulgas em Monastikari

aprendendo novas palavras

Em 21 dias na Itália, aprendemos várias palavras. Aos poucos, fomos diminuindo a embromazzione e, mesmo longe de saber de fato italiano, sempre que precisávamos acabávamos conversando em uma língua própria - uma espécie de dialeto que misturava português, espanhol e italiano. Felizmente, funcionou.
Na Grécia, a história foi bem diferente. O que ajudou foi que a maioria dos gregos fala, nem que seja um pouquinho, de inglês.
Mas nos dois países, aprendemos uma palavra que eu não imaginei que seria necessária: apergia em grego e sciopero em italiano. As duas palavras significam a mesma coisa: greve, no bom e velho português.
Na Itália, nossa viagem de trem de Gênova para Florença demorou o dia inteiro. Descobrimos da greve só na plataforma enquanto esperávamos e trem. Ou seja: descemos a longa escadaria carregamos nossas três malas ligeiramente pesadas à toa, pois tivemos que subir, trocar de plataforma e depois descer outra vez. Detalhe dramático: na verdade, fizemos esse percurso duas vezes. Poucos trens estavam funcionando e só cinco minutos antes da saída eles avisavam se aquele trem específico iria aderir à greve ou não.
Na Grécia, além dos trens, os ônibus e o metrô de Atenas também pararam - mas em dias alternados, o que fez com que a cidade não parasse de funcionar. Ontem, quando deveríamos ir de Atenas para Tessalônica de trem, fomos surpresos pela greve - na porta da estação de trem, que estava fechada com uma placa toda em grego e uma única palavrinha em inglês: strike! Greve!
E "lá vamos nós" descer, com as malas, a longa escadaria para voltar para a estação de metrô. Voltamos para o hotel para ver se nosso quartinho ainda estava vago e... não estava! O recepcionista pediu para que esperássemos um pouco, deu uns telefonemas - até achei que ele estava tentando achar um outro hotel que nos abrigasse - e me chamou, com um mapa na mão: "tem um ônibus para Tessalônica daqui a meia hora, ele sai desse lugar (mostrando no mapa) e dá para vocês irem andando daqui até lá". Fomos correndo e entramos no ônibus sem saber, inclusive, quanto tempo iria durar a viagem - que aliás, foi linda! Mar de um lado, montanhas do outro. E nem era uma ou outra montanha qualquer: era o Monte Olímpio!
Hoje fomos até a estação de trem e, felizmente, conseguimos nosso dinheiro de volta.
Em duas horas estaremos em um ônibus rumo à Istambul. De uma empresa privada, então acho que não tem erro.
Estou super ansiosa para chegar, mas já com saudades da Grécia.
Do alto da Torre Branca, onde aprendemos um pouco da história turbulenta
  dessa cidade simpática que é a Tessalônica